sexta-feira, 12 de setembro de 2008

"Grampo é a única forma de se combater colarinho branco", diz Jorge Hage


O ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Jorge Hage, afirmou em entrevista exclusiva ao Contas Abertas que o único modo para se combater o crime de colarinho branco no Brasil é por meio de escutas telefônicas. Segundo ele, a polícia precisar usar o grampo para combater e prender o criminoso que comete esse tipo de delito. "Essas investigações precisam de métodos diferentes dos usados nos procedimentos comuns. Eu não participo dessa paranóia contra as escutas telefônicas”, afirma.

Hage argumenta, porém, que se o Congresso Nacional tivesse aprovado o projeto de lei que introduz ao Código Penal o crime de enriquecimento ilícito, que tramita desde 2005, a comprovação do crime seria mais fácil. “Assim, dispensa-se a necessidade de se obter tantas provas para condenar alguém, pois o bandido é capturado pelo resultado, pelo tamanho do patrimônio. Ou ele explica que teve uma origem privada legítima ou, se ele estava atuando apenas na vida pública, como enriqueceu daquela forma?”, afirma. De acordo com o ministro, enquanto a medida não entrar em vigor, o Estado brasileiro precisa ser instrumentalizado, assim como a polícia, “braço do Estado”, para poder investigar de forma eficaz.

Clique aqui para ver o comentário do ministro sobre o referido projeto de lei.

No entanto, Hage alerta que os excessos com os grampos têm de ser coibidos. Mesmo assim, ele acredita que não há grandes problemas atualmente porque, segundo ele, a polícia só pode instalar escutas telefônicas de forma legítima com a autorização da Justiça. “Um juiz tem que autorizar esse procedimento. Mas é evidente que em alguns casos há ilegalidades, como o que ocorreu em uma situação com a polícia do estado da Bahia, com a instalação de grampos de forma ilícita. Os policiais mentiram para o juiz para obter a escuta dizendo que aquele determinado número de telefone estaria relacionado a algum crime, quando na verdade não estava. O objetivo era bisbilhotar a vida alheia”, diz.

Clique aqui para ver o comentário do ministro na íntegra sobre os grampos. A afirmação de Hage foi feita em resposta a pergunta do internauta do UOL Jobson Torres, de Maceió.

O ministro também falou sobre os seguintes temas:

Estimativas de corrupção

O ministro não acredita nas estimativas de corrupção que escritórios de consultorias internacionais realizam freqüentemente. Segundo ele, os números são “jogados” na mídia de forma absolutamente irresponsável. “A CGU não conhece nenhuma base científica que sustente e respalde esses cálculos. Enquanto não houver comprovação das estimativas, os números são apenas chutes. Nós não trabalhamos com chutes”, frisa.

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Diagnóstico da corrupção no Brasil

O ministro Hage concorda com os principais pontos que dificultam o combate à corrupção no País destacados pelo Contas Abertas. Clique aqui para ver o “diagnóstico” da corrupção. Entre eles, Hage destaca alguns aspectos. “No fundo da raiz do problema estão alguns pontos, como o financiamento privado de campanhas políticas. Se algum político precisa de apoio de empresas e empreiteiras para ser eleito, é evidente que essas empresas que dão o aporte vão cobrar isso de alguma forma em algum momento. A sistemática de elaboração e execução de repasse de recursos de emendas parlamentares também é parte crucial para contribuir para a cultura da corrupção”, destaca.

Além disso, o ministro afirma que a morosidade da Justiça também prejudica o combate a esses crimes. Mas diz que a culpa pela lentidão não é do Poder Judiciário. “A morosidade da Justiça é devida, fundamentalmente, a um problema do Legislativo em não aprovar as reformas do Processo Penal e do Processo Civil. Se não houver alteração nessas legislações, não há como vencer a lentidão nos tribunais. Nós somos o país no mundo com um dos maiores números de possibilidades de recursos e incidentes que impedem que o processo chegue ao fim. Se o acusado tem um bom advogado, ele não deixa o processo ser concluído com menos de 15, 20 anos, pois impede que o processo transite em julgado. No Brasil, a legislação só permite aplicar as penas, principalmente de prisão, depois de esgotados todos os recursos”, explica.

De acordo com o ministro, há ainda dois grandes problemas: “o foro privilegiado como está hoje, com moldes exagerados”, e os sigilos bancário e fiscal, que, segundo ele, se tornaram um “dogma” no Brasil. “Isso é um biombo para encobrir a corrupção”, critica.

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Combate à corrupção internacional

O ministro acredita que a integração entre os países é muito importante para o combate à corrupção e que a articulação internacional vem crescendo nos últimos anos. De acordo com Hage, o Brasil participa de todas as convenções internacionais de combate à corrupção “Nós participamos da convenção da Organização dos Estados Americanos (OEA), que existe desde 1996, mas que só está sendo implementada desde 2003, e a das Nações Unidas (ONU), assinada em 2003 no México. Nós ainda fazemos parte da Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)”.

Segundo o ministro, com a globalização do mundo e da economia, a corrupção também se atualizou. Por isso, de acordo come ele, o combate ao crime tem de ser globalizado.

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Projetos de leis contra corrupção

Segundo Hage, dois projetos de lei elaborados pela CGU são fundamentais para o combate à corrupção. “Um deles é o projeto de lei que tipifica como crime o enriquecimento ilícito de agentes públicos, criando a figura criminal no enriquecimento, introduzindo o artigo no Código Penal. Quando a proposta for aprovada pelos parlamentares, será possível e mais fácil condenar o corrupto pelo crescimento patrimonial que ele alcançou. O criminoso de colarinho branco é o tipo de criminoso mais esperto que tem, não deixa sua impressão digital e não deixa ser fotografado com a mão no cofre. Agora, se o agente público ficou rico e não tinha outra fonte de renda legítima, como é que conseguiu esse sucesso financeiro na vida pública? Cabe a ele provar se ganhou na loteria, ganhou uma herança, etc.”, ironiza o ministro.

Hage também lembra do PL que regulamenta os conflitos de interesses. O objetivo da proposta é evitar a promiscuidade entre os interesses público e privado. “Não há nada mais cínico e escandaloso do que os chamados anfíbios – agentes públicos que ficam migrando do para o setor privado – que ficam defendendo interesses nas empresas privadas com o conhecimentos específicos que dispõem da administração pública. A medida também disciplina a quarentena, que hoje, com o período de quatro meses, atinge apenas algumas dezenas de pessoas como ministros e membros de conselhos de políticas públicas. Com a aprovação do PL, a quarentena passará para mais de um ano e mais de duas mil pessoas poderão ser penalizadas, ficando impedidas de exercer cargo na atividade privada depois de trabalhar no setor público quando a função estiver ligada às informações que o trabalhador dispunha no serviço público”.

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Sanguessugas, Gautama e Operação João de Barro

O ministro Jorge Hage acredita, como já publicou o Contas Abertas há quase um mês, que há semelhanças nos casos dos “sanguessugas” – venda dolosa de ambulâncias – da Gautama – apontada como a principal beneficiada do esquema de fraude em licitações públicas – e da Operação João de Barro – suposto desvio de recursos em obras de 114 municípios. Segundo ele, em todos os episódios há estruturas semelhantes: parlamentares apresentando emendas ao orçamento, funcionários do Executivo auxiliando ou se omitindo quanto à fiscalização na liberação dessas emendas, prefeituras e empresas privadas beneficiadas com a situação.

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No entanto, para evitar a repetição de escândalos como esses, o ministro afirma que o setor de inteligência da CGU está comprando alguns programas de computador que armazenarão mais dados e que irão permitir que a Controladoria trabalhe de forma mais rápida e eficaz do que, por exemplo, a tradicional auditoria manual. “Também estamos trabalhando cada vez mais com portais, como o Portal da Transparência, grande instrumento de observatório da despesa pública”, explica.

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Portal dos Convênios

Segundo o ministro, o Portal dos Conmvênios, site lançado no começo de setembro que promete moralizar os acordos que disciplinam a transferência de recursos financeiros voluntários repassados pelo governo federal para estados, municípios e entidades sem fins lucrativos, é uma grande referência. “Todas as propostas serão apresentadas on-line, desde a proposta do projeto até o trâmite final da prestação de contas”, explica.

De acordo com Hage, a partir deste mês, também entra em vigor a proibição de transferência de recursos para ONGs que tenham nas diretorias parentes de agentes públicos, de políticos e de parlamentares de até segundo grau. “Também ficará proibido o pagamento em espécie por parte das prefeituras aos funcionários. Descobrimos, por exemplo, que alguns prefeitos mandam sacar cheques de até R$ 4 milhões para fazer os pagamentos em espécie. Assim, perde-se toda a condição de controle. Esses pagamentos terão de ser feitos por via bancária, inclusive com identificação do beneficiário final”, informa.

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Importância da participação da sociedade civil

O ministro acredita que a sociedade civil tem uma importância fundamental na fiscalização dos recursos públicos. Segundo ele, a CGU tem um planejamento de trabalho que busca estimular o controle social e o aumento da transparência. “Hoje, o Portal da Transparência, lançado em 2004, que exibe aos cidadãos todas as despesas do governo federal, recebe cerca de 80 mil internautas por mês. Quando o lançamos, em 2004, a média era de 10 mil. No portal, é possível verificar, por exemplo, quem é beneficiado pelo programa Bolsa Família. Com isso, se o cidadão perceber que tem alguém recebendo o benefício irregularmente, basta denunciar diretamente ao Ministério do Desenvolvimento Social, que geri o programa, ou ao próprio site da CGU. As situações irregulares estão diminuindo graças à participação do cidadão”, acredita.

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Ministro responde perguntas dos internautas do UOL

A equipe de reportagem do Contas Abertas também encaminhou ao ministro, além da pergunta de Jobson Torres, de Maceió, mais dois questionamentos de internautas do UOL sobre o tema corrupção. Em um deles, José Carlos Rizoli, de São Paulo, perguntou ao ministro se ele não se sente de “mãos atadas” para investigar e criticar o Executivo, uma vez que foi indicado pelo presidente Lula. Hage afirmou que tem toda a liberdade para atuar e que nunca recebeu nenhum impedimento do presidente Lula. “Se o presidente não desse essa liberdade para a CGU trabalhar, se ele não tivesse dado essas garantias, ele não tinha deixado o órgão crescer como cresceu nos últimos anos”, afirma.

Já o internauta que se identificou apenas como Renan, de Curitiba, perguntou qual a opinião do ministro sobre o foro privilegiado e porque o benefício persiste. Hage afirmou que é contra qualquer privilégio que não seja claramente justificado, incluindo o foro privilegiado. “Com a amplitude que se tem hoje, esse benefício não se justifica”, conclui.

2 comentários:

cardoso disse...

É natural que o Congresso Nacional brasileiro não tenha nemhum interesse em aprovar Leis que combatam a corrupção, pois se assim o fizesse estaria colocando o seu próprio pescoço na forca e a maioria absoluta de seus membros seriam decaptados por suicídio

cardoso disse...

Se a Justiça brasileira estivesse realmente interessada em apurar enriqueciento ilícito que no Brasil tem berço no Congresso Nacional e distribui suas benesses para os demais Poderes tendo o Judiciário como maior beneficiado, já deveria ter intervido no sentido de fazer valer Leis que obrigam governantes a prestar contas de suas fortunas adquiridas no exercício da política e consequentemente a devolução ao país dos bens sem procedência que são frutos do roubo aos cofres e patrimônios públicos